Passamos com o tempo
Quando deixamos de lado certas cerimônias e decidimos viver
sem tantas neuras percebemos que estamos ficando velhos. Isso porque nossas
expectativas costumam envelhecer junto com seus donos. Envelhecer... o que
significa isso?
Essa reflexão acompanha esse momento lindo que tenho passado
com meus amigos e familiares, pois todos estão fazendo trinta anos ao meu
redor! Meu deus! Mas o que significa envelhecer? Essa pergunta bate a minha porta, principalmente agora que estou prestes a dobrar o cabo da boa esperança.
As vezes me pergunto o que faz com que algumas pessoas mudem fisicamente, mas continuem com suas
manias? Enquanto outras que acabaram de desembarcar nessa bela existência
parecem trazer o “manual da vida” no bolso, sacam tudo “de cara” e já sabem o
que querem da fazer com uma certeza de invejar...rs
Envelhecer significa continuar, estar em movimento. Nosso
corpo necessariamente acompanha as estações, se desgasta debaixo do sol, ele
está exposto ao devir por sua própria constituição e ainda que gastemos nossas
economias em plásticas e cremes, nos alimentemos com cuidado, evitemos os
vícios, nossas células possuem um contato tão íntimo com a essência das coisas
que ela inexoravelmente “acompanha” a realidade, como denuncia o pescocinho pelancudo
daquelas velhinhas esticadas.
As pessoas que possuem um caráter irresoluto, com várias
certezas e indignações, aquelas mesmas pessoas que exercitam a reclamação e o
papo que não transcende o trabalho ou o cônjuge, essas pessoas não permitem o envelhecimento de suas almas. O corpo se torna um invólucro no qual a alma se esconde, se
protege, não deixa os ventos áridos soprarem sobre a delicada superfície
de nossas crenças. Neste estado a alma permanece intocada, tenra e,
infelizmente, imatura.
Aquelas almas que deixam suas certezas de lado e procuram
novas respostas acabam se aproximando dos movimentos conceituais e dos ventos
éticos que moldam a pele de nosso caráter, o que inicia o “envelhecimento” de
nossas concepções de maneira que em cada época parecemos diferentes, com formas
transformadas pelas “estações espirituais” – tipo quando perguntamos quem criou
Deus, depois perguntamos por que existe tanto sofrimento no mundo!? Depois de
encher o saco de Deus, com muito amor Ele nos responde: “Onde estavas tu, quando eu fundava a terra? Jó 38:4. Aí nossas folhas caem e nos tornamos mais secos,
nos colocamos em contato com a exterioridade, algumas marcas aparecem em nossa
alma.
As marcas compõem uma nova aparência, mais robusta e
resistente. Nossa alma possui uma identidade composta pela interação com as
intempéries e a beleza de nosso amadurecimento comporta nossos galhos quebrados
e algumas feridas cicatrizadas. Mas o mais importante é que o vigor das novas
folhagens surge desta mesma interação, logo, da violência das marcas surge em
contrapartida a beleza de uma árvore revigorada.
Envelhecer, amadurecer e amar tem um sentido próximo deste
ponto de vista, pois o relacionamento nos coloca em movimento junto com esses
elementos múltiplos que nos cercam e assim acabamos por nos distanciar do ponto
de partida, o que nunca será algo negativo.
Aprendi com a primavera; a deixar-me cortar e voltar sempre inteira.
Cecília Meireles.
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