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Mostrando postagens de 2017

A moralidade vale a pena?

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Aqui estamos nós encerrando mais um ano. 2017, assim como 2016, não foi um ano muito amigável. Foi um ano que tirou pedaços, ferindo de morte algumas ilusões, não nos deu tempo de puxar um fôlego. O ano exigiu que despertássemos novas forças, nos obrigou a tomar uma atitude diante da vida... percebemos, desolados, que as escolhas estão acabando. Gostaria de falar aqui sobre algumas experiências que me marcaram nestes últimos dias de 2017. Alguma semanas atrás eu terminei meu curso de psicanalise e quando cheguei em casa a vizinha, uma senhora normalmente simpática, estava nervosa e disse que tinha uma má notícia para mim. Várias casas tinham sido roubadas, incluindo a minha. Encontrei minhas coisas reviradas e percebi que todos os eletrônicos haviam sido levados. O roubo aconteceu momentos depois que escrevi meu último post. Os ladrões estavam aguardando minha ausência e entraram logo em seguida, arrombando três casas e, pra variar, ninguém viu nada e ninguém colaborou com nad

O medo e a barganha

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Escher - 1948 - O que você faria se fosse traído? Se descobrisse, lá pelas tantas, que a o seu parceiro está se relacionando com outra pessoa? - Você tá doido!? Nossa! Ficaria puto, terminaria, mataria, jogaria coisas pela janela... - Você já foi traído?  - Não. - Como você sabe? - (um sorriso de touché) Porque nunca namorei. - Então, por que fala com raiva quando pensa na possibilidade da traição? Como sabe o que sentiria se nunca foi traído? Por que raiva e não espanto, angústia ou medo? Como ter tanta certeza do que sentir, sem nunca ter passado por essa situação? As pessoas falam de seus afetos como se eles surgissem espontaneamente de nosso corpo - como se fossemos a origem dos afetos. Isso me faz lembrar de quando eu sinto medo, medo de que algo dê errado, de perder um amigo, de fazer uma besteira, etc. Quando sinto medo já estou sofrendo a perda, a tragédia e a besteira feita, assim como o náufrago que abraça o medo da morte acaba por encontra-la, o medo

Isso aqui é arte?

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Daniel Coury/divulgação Pintura de Pedro Moraleida Isso é arte? Pergunta o vereador Jair DiGregorio durante uma visita filmada pelo próprio e exposta nas redes sociais. Ele diz que foi eleito para proteger a população de Belo Horizonte daquele tipo de coisa. Durante as filmagens, um instrutor do museu se constrange e pergunta se ele entende de arte, ou seja, se ele sabe do que se trata aquela exposição, mas o vereador diz que não precisa provar os seus conhecimentos artísticos e quer provar que aquilo ali não é arte. Pergunta enquanto filma quadros da exposição de Pedro Moraleida: isso aqui é arte?     Acho interessante esse movimento de políticos que defendem a família, celular em punho, protestando dentro de um museu contra a arte degenerada. "Contra a pedofilia, pornografia, etc..." são normalmente as palavras de ordem. Existe nesse movimento uma coisa de libertação - um desabafo - creio. Por quê? Acredito que toda alta cultura e todo o mundo acadêmico geralmen

O fim do juízo

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Ouvi algumas pessoas comentando sobre o fim do mundo, de um alinhamento celeste que aparecia em uma passagem do Apocalipse bíblico. Saber que algo do Apocalipse está acontecendo nos dá um certo calafrio já que o livro em questão é famoso pelas tragédias que habitam suas páginas. As poucas coisas que fazem sentido neste livro da Bíblia é que coisas ruins vão acontecer no final da história judaico cristã, mas isso só para aquelas pessoas más que não são nem judaico nem cristãs. Terremotos e furacões, guerras e pestes ceifando as vidas de frações da população terrestre são parte do anticlimax que Deus preparou para aqueles que não pensam igual Ele. Tudo isso, claro, faz muito sentido se ligarmos o noticiário; o que me faz pensar o quão cristão é o nosso jornalismo e o quanto estas instituições reproduzem uma retórica moralista que busca convencer as pessoas de que muitas coisas ruins acontecem e que "fazer nossa parte" consiste em condenar tudo isso que anda acontecendo. I

Cartografias estão na moda

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Esqueci meus medos embaixo da cama Como andam meus afetos? Ando me perguntando e observando... por onde anda a minha alegria? O que sinto com mais frequência ultimamente? Raiva? Frustração? Vi uma publicação dizendo que temos não mais meia dúzia de afetos, mas vinte e tantos. Deve ser verdade, afinal foi uma instituição americana que pesquisou. Quando penso sobre isso começo a me sentir um biólogo caminhando por território desconhecido, vendo seres em movimento, migrações e aglomerações. Seria possível sentir mais alegria e menos tristeza? Como estimular uma alteração do ecossistema afetivo de forma a multiplicar sentimentos bacanas e abater os espíritos selvagens que sejam negativos, tipo o medo? Como não sentir medo nos dias de hoje? Essa é uma pergunta que eu não pretendo responder. Usarei uma abordagem diferente, binóculo em mãos, observarei seus ajuntamentos e ninhos. Sinto uma revoada de medos diante da possibilidade de fazer uma cagada irreparável. Nossa, bastan

O peso de nosso olhar

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Google imagens "Se a pena tivesse caído, se tivesse feito descer a balança, a casa inteira teria mergulhado nas profundezas para se assentar nas areias do olvido(esquecimento)."  Essa citação foi retirada da obra "o tempo passa" de Virginia Woolf. Nesta obra curta, umas cinquenta páginas, Virginia narra a trajetória de deterioração de uma casa abandonada por seus donos após a primeira guerra mundial, acho que é isso. Usei um outro trecho em meu post passado, e as palavras buscam descrever a situação de uma casa invadida pelas forças da natureza. Segundo o filósofo Michel Serres, a obra trata do combate entre as forças da entropia e da ordem, ou do velho conflito filosófico entre idealismo e realismo. Como assim? Bom, as vezes é realmente maneiro ler comentaristas de literatura, afinal esses caras apontam coisas que acendem nossa leitura para aspectos inusitados. Para Michel Serres, "o tempo passa" mostra como a presença humana, personificada

Não sabem que chove

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No saben el caminho - Goya "Escurecia. Nuvens cobriam a lua; uma chuva fina tamborilava no telhado nas primeiras horas da manhã, e a luz das estrelas e a luz da lua e toda a luz do céu e da terra se apagara. Nada podia sobreviver ao dilúvio, ao derramamento, à tromba d'água de imensa escuridão que, insinuando-se pelos buracos da fechaduras e pelas frestas, metia-se pelas venezianas, atingia os quartos, e engolia, aqui um jarro e uma bacia, ali um vaso de dálias rubras e amarelas, acolá as agudas quinas e o sólido corpo de uma cômoda. Não era só a mobília que se desintegrava; não restava quase nada de mente ou corpo pelo qual se pudesse dizer "isso é ele" ou "isto é ela"..."  Virginia Woolf Estou aprendendo a contemplar as coisas graças à meditação. Paro e observo, respiro. A meditação nos permite ser de forma menos verbalizada e isso acaba alterando a forma como conduzo minha vida no dia a dia. Quando entro em um metrô ou ao adentrar uma sa

Ao redor das árvores

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Árvore dançando Quando criança vivia ao redor das árvores. Acredito que isso acontecia porque elas estavam sempre lá...disponíveis. Havia algumas árvores um pouco anti sociais, sem nenhum galho baixo para poder nos apoiar, mas a maioria sempre deixava um galho firme em sua base que permitia aos pequenos o prazer de subi-la. Uma árvore é a própria definição de generosidade, tanto é que sempre quando imagino uma, logo me vem a cabeça frondosos galhos estendidos como braços abertos.  Subir em uma árvore me ajudava a mudar o olhar, arejando aquele mundo demasiadamente grande do qual as crianças costumam se esconder na barra da saia de suas mães. A escalada nos firma as mãos e nos ensina a enfrentar o frio na barriga, perceber galhos podres, frágeis. Aprendi a confiar, nada me desperta mais confiança que um galho de goiabeira. Adorava cortar árvores, podava-as quase todo mês - coitadas. Contudo, elas nunca reclamavam. Não sei que zelo jardinístico tomava conta de mim para me f

Um filósofo dos contos de fadas

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G. K. Chesterton / (Domínio Público) Difícil encontrar um religioso que não se exaspera diante da possibilidade da discussão. Entrincheirando-se em uma pseudo superioridade mística, acaba por desperdiçar a oportunidade de descer à arena dos argumentos. A percepção do sagrado encontra inimigos de todos os lados da batalha, tanto dos religiosos quanto dos céticos, ambos tem colaborado para que a espiritualidade permaneça nas sombras. A questão toda se coloca quando levantamos nossas bandeiras. Você é um believer, eu sou uma pessoa razoável... às armas!  Qual é o problema deste início de conversa? Existe uma escolha de terreno estratégica que me lança no pântano da crença, sendo que o resto da discussão se passará na redução da fé como uma fuga covarde diante da perspectiva de viver uma única vez, como se a fé fosse apenas uma questão de ter um barco salva vidas no curso de uma vida fadada a acabar. O tema da fé como miragem, ou ópio, para desesperados viventes de um planet

Aos mendigos de Deus

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Rabbi Lau-Lavie oficializando o casamento. Cortesia de Bonnie Burke Ouvindo o On being essa semana conheci a história de um rabino chamado Amichai Lau-Lavie. Em seu web site podemos ver a descrição de um de seus projetos, o Lab/Shul - "Lab/Shul é um espaço aberto para todos os públicos, direcionado para arte, Deus é opcional, uma comunidade experimental para encontros sagrados judaicos localizado em Nova York, alcançando o mundo." Essa descrição expõe algo que o rabino acredita ser o mais importante do sagrado - a experiência humana do encontro e da troca de histórias. O rabino optou por valorizar o sagrado pela ressureição de uma tradição oral e não por um ritual vazio. Quando descreveu um encontro para lembrar o falecido pai, o rabino Amichai disse que seus irmãos passaram todo tempo tocando músicas, mas não conseguiram conversar. Por isso decidiu elaborar um culto mais flexível, onde as pessoas pudessem trocar experiências. Deus, segundo ele, é uma palavra

O que é a vida?

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Antônio Abujamra em seu programa Provocações A maioria das religiões dizem que a vida é uma escola, sendo que cada experiência encerra uma pergunta oculta. A pergunta que fica é se estamos respondendo corretamente, senão, teremos que repetir de ano, ou reencarnar e tentar novamente. Para os cristão, nossas ações serão anotadas e usadas em nosso juízo final, depois do qual seremos elevados à vida com Deus, ou ao fogo que não se apaga.  Tendo poucas mitologias em meu horizonte, acredito que as alternativas do pós morte não são muito otimistas, muito menos criativas. Contudo algo me inquieta mais do que a perspectiva de encontrar Deus em um juízo do qual não poderei apelar... Imaginar o diabo se aproximar lentamente e sentar-se à minha frente, corcunda e com um sorriso sarcástico, perguntando-me: O que é a vida? Seria a vida... Uma criança deixou a bola cair entre os arbustos. Indo buscá-la, foi picada por uma serpente.  Continuou jogando sua bola, sentindo um incômo

O último teste - histórias que nos ajudam a encontrar o caminho

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Toda trilha tem seu cão brother Este conto está no Mahabharata, no livro da Grande Jornada. Este relato contempla a subida do Himalaia para buscar o céu de Indra. "Os cinco irmãos, com Draupadi formado o sexto, e um cão formando o sétimo, partiram em sua jornada." Como toda boa história de peregrinações, sempre existe um cachorro que acompanha a equipe incansavelmente por todas as quebradas da viagem. Após todos os companheiros caírem pelo caminho, Yudistira segue com seu cão em busca do céu de Indra e sua prova final seria justamente decidida pelo destino do pobre animal.  “Shakra disse, ‘Tu verás os teus irmãos no Céu. Eles o alcançaram antes de ti. De fato, tu verás todos eles lá, com Krishnâ. Não te entregues à aflição, ó principal dos Bharatas. Tendo abandonado os seus corpos humanos eles foram para lá, ó chefe da linhagem de Bharata. Com relação a ti está ordenado que tu deves ir para lá neste mesmo corpo teu’. “Yudhishthira disse, ‘Este cão, ó senh

Por uma fé com sombras

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A vida sem fé é um caminho sem sombras para nos consolar - foto retirada google imagens " Os fundamentalistas religiosos se veem como se tivessem o remédio para as doenças do mundo moderno. Na realidade, são os sintomas da doença que pretendem curar." John Gray Lembro-me de como vivia pelos idos de 1997 pela facilidade em associar o 7 com a 7ª série. Naquela época a magia da 6ªsérie estava em decadência, pois começávamos a ter notícias das turmas mais velhas, no caso o pessoal da 8ª série, e isso não era uma coisa fácil de digerir. Perder nossos amores para aqueles garotos mais velhos, sofrer um pouco de bulling, ficar feio, bigodinho, espinhas, brigas inexplicáveis, cusparadas caíam em nós como cocôs de passarinho. A vida tinha perdido o glamour que havíamos experimentado pouco antes, quando matávamos aula para fazer qualquer coisa e éramos os mais velhos do período da tarde. Estudar a tarde era mais tranquilo para curtir a escola. Existia uma calmaria no a