La petite mort

Hoje em minhas andanças pelas livrarias me deparei com uma capa bem interessante, após algumas folhadas decidi anotar o título para pesquisar preços - “La petite mort”. Eu que não saco nada de francês, me surpreendi com a tradução do Google, “the little death”. Poxa, o que tem isso a ver com sacanagem!?

“A pequena morte” seria o momento do orgasmo, o clímax sexual, aquele momento que tanto nos interessa, pelo qual ansiamos quando nos relacionamos com alguém, que motivam todas as nossas ações (afinal, tudo o que a gente faz...) é, enfim, uma pequena morte. Segundo fontes não muito confiáveis, este eufemismo teria um fundo de verdade, pois reflete um estado emocional decorrente de um menor fluxo de sangue em partes do cérebro cuja função é controlar nosso comportamento. Mas por que pequena morte?

Uma criança que leia francês folhando “La petite mort” entenderia perfeitamente o eufemismo, pensaria... “a moça esta sofrendo, meu deus” agora, para mim foi uma surpresa. Os romanos acreditavam que no momento do orgasmo perdíamos um dos quatro humores e por isso um pouco da nossa vida também se esvaía. Outros autores diziam que o orgasmo é um momento tão sublime, transcendente, que realmente sentiam estar prestes a morrer, mas o que chama minha atenção é perceber que um momento que aparentemente perpetua a vida seja conhecido por uma pequena morte.

Hoje de manhã li um texto sobre o amor de um sociólogo chamado Simmel, onde o comportamento das “coquetes” é milimetricamente analisado. As coquetes eram aquelas garotas que se dedicavam à arte da conquista, possuíam uma beleza que não compartilhavam, olhavam apenas com o “rabo dos olhos”, furtivamente; davam toda atenção ao cachorrinho, ao bichinho de estimação e andavam com um balanço característico de quadris que parecia um ritmo de oferta-recusa, tudo isso completando o jogo cuja finalidade é permanecer em um momento intermediário, nunca consumado. O amor seria este jogo da conquista, sendo que a sedução se amplifica sobre a tensão da dúvida. Quando a coquete dedica sua atenção ao bichinho está, na realidade, querendo dar esta atenção àquele que a observa, conversa com todos, menos com aqueles que a interessam, desejam demonstrando indiferença. A coquete reproduz um movimento que parece reverberar por todas as coisas, animadas ou inanimadas, o que, a meu ver, começa a explicar o “La petite mort”.

Em um determinado momento do filme “A partida” o personagem principal contempla do alto de uma ponte as trutas subindo o rio para desova. Ele não entende por que elas se esforçam tanto para subir o rio, já que morrerão após encontrarem seu destino. A vida olhada de cima parece não fazer sentido, por isso que uma breve reflexão sempre nos leva a uma perspectiva pessimista de nossa realidade. O termo La petite mort pode ser aplicado também àqueles momentos em que algo em nós deixa de existir, um momento irreversível como a perda de um ente querido, onde percebemos que nunca seremos como antes e um caminho totalmente desconhecido se apresenta, uma vertigem nos perpassa, pois não sabemos como será nosso amanhã. Acho que deste ponto de vista envelhecer significa perceber que a cada dia morremos um pouco, e viver não significa mais apenas seguir um caminho irrefletidamente, pois nossa consciência nos indica uma ausência de saída, afinal, somos os únicos seres afortunados que possuem consciência de seu próprio fim.

O que diferencia um orgasmo de uma constatação de impermanência é que o um nos atrai e o outro nos espanta, porém, no final das contas, ambas querem dizer a mesma coisa – La petite mort!

O livro, pra quem se interessar: La petite mort – Ed. Taschen. Fotos de Will Santillo.

Comentários

  1. poxa,vc´s naum comentam pq dizem q os assuntos são muito eruditos, quando eu falo de orgasmo ninguém comenta!? rsrsrs

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