Quarentena: crise econômica ou greve geral

Situação de milhões de brasileiros antes e depois do Covid-19


A descoberta que precisa ser apagada

O estado de quarentena instalado pela emergência do Covid-19 implica na paralisação de 1/3 da população mundial, fato que poderá causar uma crise econômica tão destruidora quanto o próprio corona vírus. Bom, isso é o que o nosso Presidente e aqueles que representa (provavelmente pessoas como o Sr. Junior Durski do Madero/Tallis Gomes/presidente do BB) estão tentando nos convencer, questionando o rigor das medidas adotadas pelos governadores e levantando um papo furado de quarentena vertical... isso me faz crer que um novo jargão aparecerá em breve - o coaching infectologista.

O ponto inusitado desta crise é que ela deu origem, na verdade, a uma greve geral indireta. Por isso que nosso presidente está desesperadamente tentando deslegitimar a intensidade da pandemia. Ele e Trump são os representantes mais lúcidos de um capital que está sendo colocado contra a parede pela paralisação do comércio.

Mas qual é o verdadeiro problema de estarmos em quarentena... seria a crise econômica?

O grande perigo que se esconde por trás da quarentena é a descoberta, por parte dos pobres e desassistidos, da possibilidade de remediar sua penúria existencial sem ter que se submeter ao mantra dos especialistas: crescimento econômico, aumento das vagas de emprego e PIB. Se o Estado brasileiro fizer pelos pobres pelo menos 1% do que normalmente faz pelos grandes conglomerados de capital quando em crises econômicas, os pobres vão notar que EXISTEM ALTERNATIVAS que quebram aquela mono narrativa de que se a economia quebrar eles serão demitidos, cairão na miséria, etc.

O 2+2 do Presidente 

Neste exato momento, o Brasil testemunha um aumento vertiginoso do numero de casos de Covid-19, porém ainda não está instalado o caos que países como Espanha e Italia estão vivendo neste momento. Isso dá ao Presidente uma "janela de oportunidade" de alguns dias. Ele sabe que um povo que está acostumado a viver com menos de um salario mínimo é capaz de aguentar qualquer calamidade, sendo que eles temem mais os malefícios instantâneos da quarentena do que um colapso que não está em seu horizonte. O presidente sabe que a tolerância ao sofrimento de alguém que compartilha um cômodo com 9 pessoas é muito maior do que daqueles que dispõem de reservas, investimentos e imoveis para bancar uma possível crise econômica, sendo que o número de brasileiros na pobreza e miséria é muito alto, pessoas que na prática não conseguem se colocar em isolamento. Tal conjuntura o faz acreditar que interromper a quarentena não irá mudar o quadro absoluto do Brasil, pois os mais privilegiados economicamente não irão retornar às atividades por medo da Covid-19, enquanto que para os pobres nada irá mudar, tirando o fato de que terão seus subempregos de volta.

Se a quarentena se estender, será inevitável um debate no sentido de minimizar a penúria da população desassistida e autônoma - isso é o que o capital não pode permitir de maneira nenhuma. O capital não pode perder o monopólio da ameaça de morte e miséria que está nas suas mãos. Esse poder é o que permite aos donos do capital pressionar os indivíduos a abrirem mão de suas vidas para se dedicar integralmente ao trabalho.      


Por que não relativizar a quarentena e torná-la uma greve geral?

Neste momento "donos de negócios" fazem suas lives para convencer o trabalhador que seu emprego está em jogo, que a crise econômica pode ser mais nefasta que a morte pelo corona. Agora, fico pensando no que aconteceria se os funcionários dessas companhias decidissem subir o tom da ameaça e dizer que não voltarão nem que achem a cura do Covid-19. O que aconteceria se os funcionários se unissem por aqueles que tem seu trabalho ameaçado e instalassem uma greve-quarentena geral? Se até agora estamos tentando cooperar com a OMS para diminuir os estragos da pandemia e preservar o maior numero de vidas, e mesmo nesse cenário esses "homens de negócios" continuam relativizando a crise de saúde pelo viés econômico, por que não relativizar a quarentena pelo viés de uma greve geral para fazer esses desvairados caírem na real só um pouquinho?

A maioria dos países mais ricos assumem uma postura mais branda economicamente, o tal Estado keynesiano, distribuindo valores(decentes) à população ou adiando dívidas, impondo um lockdown severo para sua população, enquanto países asiáticos deram uma turbinada na vigilância digital, realizaram testes em massa e impuseram restrições como bloqueio de cidades. Nesses países os empregados querem colaborar com os esforços de contenção da doença porque se sentem ajudados pelo Estado. Aqui, me parece que o Presidente vem oscilando e radicalizando, flertando com o que nenhum país no mundo fez até o momento, justamente porque ele não quer combater a epidemia e certos homens de negócios também não querem. No fim, a conta vai cair nas costas dos desassistidos de qualquer maneira, então por que manter a quarentena? Por que não deixar eles se foderem enquanto fazemos um bem bolado, separamos uns leitos de UTI para galera que pode fazer homeoffice, ou seja, pra quem realmente importa? E os empregados aqui seguirão colaborando com um Presidente que nitidamente está cagando para sua população, isso em todos os sentidos possíveis?

Tudo isso para quê? Para salvar a economia? Nós pobres queremos mesmo salvar uma economia que só nos fode? E o Presidente... quer salvar os pobres ou a economia? Você sabia que no ano de 2019 a bolsa de valores brasileira fechou com uma alta de 31,6% e superou a marca de 1 milhão de investidores*, e isso mudou o que na sua vida? Agora que ela caiu, você precisa se expor à gripezinha senão os negócios vão quebrar.

O que os pobres brasileiros ainda não descobriram, e eu diria que os pobres do mundo também não o fizeram, é que a quarentena se tornou uma oportunidade única para que possamos descobrir nosso poder de barganha num cenário globalizado. Os mais ricos utilizam largamente os recursos da globalização, seja para pagar menos impostos, sonegar, explorar mão de obra barata(você), poluir, ampliar mercados consumidores, etc. Agora, como os mais pobres tem utilizado a globalização economicamente falando? A única coisa que me vem a mente seria a imigração em condições terríveis, agora, o que aconteceria se os mais pobres do mundo se unissem nesse contexto de quarentena para reivindicar uma renda universal a ser capitada pela taxação dos mais ricos de todo mundo? Nós precisamos globalizar a pobreza.

Vamos esperar os ricos fazerem essa proposta? Eles irão optar por acabar com a quarentena

Tal iniciativa daria condições dos Estados saírem da posição de reféns de seus bilionários, sem perdê-los para países mais flexíveis do ponto de vista tributário (como revelado nos panama papers). Tal órgão internacional seria a resposta para manter a maioria da população em paz durante a manutenção da quarentena... e por que não ser uma medida permanente?

Esse é o momento em que a população desassistida pode virar o jogo, ironicamente, sem querer. Tal atitude pode permitir o acesso aos enormes recursos disponibilizados pela exploração econômica globalizada. Esse ato seria uma manifestação de justiça histórica, proporcionando uma melhor distribuição de renda e a restituição mínima das riquezas às mãos daqueles que a produziram.

Sem não fizermos nada, a quarentena será cada vez mais questionada, assim como já está sendo. 

*https://istoe.com.br/a-era-da-bolsa/

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