Encontrando nosso leão

Hércules encontra o leão

Eu decidi parar.

Por uma razão inexplicável eu decidi retornar ao ponto de partida, compreender porque estava ali e tentar alterar minha maneira de ser e viver no mundo. Esse percurso de retorno tem se revelado árduo em vários sentidos e as paisagens são bem diferentes do que eu estava acostumado. Estou, lentamente, voltando às minhas origens.

Desde muito cedo nos acostumamos a agradar e cumprir nosso papel na sociedade, estudamos, escolhemos amores e carreiras, e quando um dia decidimos parar algo estranho acontece: você percebe que não consegue parar. Todas as tentativas de mudar se desfazem em suas mãos e quando acordamos, percebemos que estamos no mesmo lugar de sempre e que nossos velhos medos chegaram em alguma hora perdida na madrugada da alma e realizaram algumas mudanças na fachada. O suficiente para acreditarmos que mudamos.

Quando percebemos isso, tudo começa a ficar pior, pois os velhos medos precisam se esforçar mais para nos enganar, eles passam a nos ameaçar e agir de forma deliberada contra nossa nova postura. Neste ponto comecei a perceber que a minha vida não é apenas o resultado de minhas decisões geniais, ela é o resultado de vários acordos antigos, firmados para a preservação de minha continuidade nesta existência. O que acontece é que agora eu gostaria de rever estas decisões, retirar algumas cercas de minha alma e reflorestar minhas nascentes, porém, o que acontece é que certos elementos de minha alma se rebelam e retiram seu apoio. Este momento é o que eu poderia chamar de outono da alma, quando o mundo ao meu redor passou a desmoronar e secar.

O problema de mudar não são as pessoas te dizendo que você pode estar errado, não são as privações, o grande problema de mudar é que você precisa se haver com os seus medos mais profundos, os mesmos medos que te sustentam agora nesta vida que não faz mais sentido nenhum.

Parar e voltar é este encontro irremediável com seus maiores medos, porque de uma forma ou de outra este foi o nosso ponto de partida. Nessa hora escura nos aproximamos de nosso destino, daquele caminho que nunca saiu de nossos sonhos e que parecia tão longe de nossa realidade.

No conto do príncipe Adil e os leões o príncipe precisa passar por um teste para aspirar ao trono:

"O príncipe seguiu seu pai e o grão-vizir até uma cova que ficava numa rocha a uma certa distância do palácio. Nela havia uma porta com uma grade. O príncipe olhou através da grade e viu lá dentro, ao fundo, um enorme leão. Ao vê-lo, o animal levantou-se e soltou um rugido de fazer estremecer as paredes. No chão da caverna havia uma grande quantidade de ossos.
- O que significa isso? - Perguntou Adil com muito medo.
- Sua prova é enfrentar esse leão, disse o rei, como todos os seus antepassados fizeram antes de você, para serem dignos de herdarem o trono."

O príncipe, amedrontado, fugiu, mas a cada nova paragem ele encontrava um novo leão a espreita, o que o fazia novamente fugir e fugir...sem parar. Até que um dia, cansado de fugir, ele decide retornar ao reino de seu pai e enfrentar o leão. No caminho de volta, Adil se identificava e admitia que estava fugindo de seu reino para todas as pessoas que havia encontrado, eles lhe respondiam: "eu sabia desde o início que você era filho de Azad devido a sua grande semelhança com ele, aliás, maior agora do que no dia em que você chegou aqui."

Parar de fugir e retornar para o início de nossa jornada, isso é o mesmo que encontrar nosso destino. Neste retorno vamos nos transformando naquilo que estava ainda em germe habitando o fundo de nossa alma e quando enfrentamos nossos medos podemos, então, florescer nossa verdadeira essência.

Agora, podemos perguntar, por que um leão!? Não podia ser um cachorro, uma hiena, sei lá... algo menos amedrontador, justo um leão!? O leão é o símbolo da existência em sua potência máxima, O signo que está no céu na colheita dos frutos do verão no hemisfério norte, o que me faz acreditar que existir é uma experiência que exige o máximo de nós, nada menos é suficiente.

Lentamente me aproximo de meu leão, lembrando do conselho do rei Adil

"nunca fuja de um leão"

O conto de Adil e o leão eu encontrei no livro Acordais, de Regina Machado, carinhosamente emprestado pelo meu amigo Santiago. Prometo que devolvo..rs

Obrigado a todos que encontrei pelo caminho e todos aqueles que me abrigaram e confortaram nessa jornada. Sou infinitamente grato a todos vocês. I love you all!

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