Sonhando acordado

“Estamos próximos de despertar, quando sonhamos que sonhamos.” – Novalis

Ontem, em uma conversa de mesa na hora do café da manhã, um amigo disse ter lembrado de um sonho, porém, não conseguia lembrar com clareza. Por fim, me perguntou se eu já havia sonhado sabendo que estava sonhando, “isso é muito legal” - disse, lembrando de uma reportagem que ensinava a controlar esses momentos de lucidez onírica, porque sempre acordamos quando descobrimos que estamos sonhando.

Talvez isso aconteça em alguns momentos de nossas vidas. Às vezes tudo se desencanta, as reportagens dizem as mesmas novidades, os lugares novos já não surpreendem mais, o final de semana já não é tão legal e a segunda não é tão ruim quanto costumava ser. Aos poucos nossos pés começam a flutuar e perdemos o contato com o Outro, ouvimos apenas sons, respiramos profundamente - quantos aromas escondidos passam pela nossa mente e sequer nos permitimos sentir. Nós nos desprendemos à medida que conseguimos superar nossas questões e em apenas um segundo nos descolamos do que nos envolvia anteriormente, um paradoxo – não podemos usufruir de nossa lucidez. Quando descobrimos que estamos sonhando dentro do sonho a primeira coisa que pensamos é – nada importa, posso fazer o que eu quiser! Quando começamos a correr para satisfazer nossos desejos tudo se esvanece, até finalmente abrirmos os olhos.

Novalis diz em sua obra “Polen” que podemos amar somente indiretamente, mas o que seria amar indiretamente? Parece-me que o amor se assemelha ao sonhar – amamos enquanto não sabemos. Assim, amar indiretamente seria participar de uma experiência da qual não fazemos parte integralmente, somos “levados” a lugares bizarros sem nos espantar, dançamos sem saber, voamos pelas ruas e paramos para tomar um sorvete. Se existem dúvidas, lembrem-se do que fizeram quando estavam “flechados” pelo arqueiro cego, dos lugares que nos dispomos a ir pela pessoa amada, das coisas estranhas que bolávamos para chamar atenção daquela garota(o)...

Quando nos perguntamos pelo amor e compreendemos porque amamos, porque tal pessoa nos faz tão feliz ou não faz, então nos aproximamos do fim do amor. Estranho não!? Costumamos descrever a pessoa ideal sem perceber que estamos descobrindo o sonho, o que para mim é uma pena, pois a graça do sonho e do amor está em nos fazer flutuar deste chão duro de nossas certezas e descobrir essa multiplicidade de pessoas e lugares que habitam nossa alma.

Talvez amamos um pouco todos os dias, sem saber!

Comentários

  1. pati.. vc tah zicada da mão porque vc só escreve a trabalho! isso é praga do cupido..rs

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  2. Muito bom, Japa!
    Certamente, racionalizar o amor é uma grande besteira. Mesmo por que é tão impossível quanto racionalizar o sonho sem acordar. O Amor é aquilo que nos faz perder o controle. Se controlamos já não é amor.
    Em homenagem ao Zen:
    Quando se ama, Algo ama. É o momento sublime do tão difícil desprendimento do eu.

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