O crente político
"Respondeu Jesus: o meu reino não é
deste mundo; se o meu reino fosse deste mundo, pelejariam os meus
servos, para que eu não fosse entregue aos judeus; mas agora meu
reino não é daqui." Jo18:36
Ando observando o comportamento de
políticos e lideranças em torno de uma abordagem mais aberta do
tema da sexualidade nas escolas e cada comentário geralmente inicia
com um “venho de uma família cristã”, depois um “este é um
assunto delicado” e tudo indica que isso será sumariamente
engavetado, ou simplesmente retirado de pauta. Existe um movimento
que busca defender a família como “deus fez”, criticando uma
coisa que eles definem como “privilégios dos homossexuais”, pois
aos olhos das lideranças cristãs, as leis estão sendo manipuladas
para beneficiar apenas esta parcela da população(os gays) em
detrimento dos heterossexuais e da família tradicional.
Aí encontro uma matéria do Pastor
Silas Malafaia dizendo que a política é laica, mas o povo não é.
Concordo, e fico impressionado com os debates do Feliciano, pois ele
sabe aproveitar muito bem a ideia de democracia e sua postura é
legitima do inicio ao fim, o que seus debatedores não
percebem e ficam se debatendo o tempo todo para
desqualificá-lo, coisa que só seria possível se conseguissem
desqualificar a própria ideia de democracia. Me lembro dos debates
na FFLCH com palavras de ordem para retirar o Feliciano da
presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, por quê?
Bom, porque ele é crente. Acredito que se ele se arrogasse a
presidência da Comissão por um direito divino, poderia então
concordar com meus colegas FFLCHeanos, mas não foi o caso. De novo,
contemplo a tal da democracia estampada no sorriso amarelo do Pastor
itinerante.
Lembro-me da época das eleições
quando o Pastor Malafaia mostrou imagens do Estado Islâmico matando
pessoas e associando estas imagens a perseguição de cristãos, o
que ele costurava com um pronunciamento da diplomacia brasileira a
respeito do EI, depois de muita saliva no monitor, ele emendava que a
presidente Dilma compactuava com o EI e que não podia concordar com
isso. Tipo, “não peço pra você votar não votar na Dilma, mas...”, aqui
o reino de Jesus começou a ser deste mundo e o pior, o Pastor fez uso das imagens grotescas para pressionar seus ouvintes a não votar em Dilma. Me pergunto se isso não seria pior que o uso das imagens por parte do próprio EI, uma afronta a todos aqueles que morreram, cristãos ou não, para servir de instrumento de coerção na mão destes militantes fundamentalistas, e agora, do Pastor político.
O crente político é um ser legítimo,
ele sabe disso. Agora, a postura política dos crentes está muito
distorcida, isso porque os crentes não se preocupam em entender o
político. Intervir maciçamente na alteração de leis para
transformar a sociedade em um espelho de seus valores, isso não é
política, é outra coisa, mais oportunista, matreira. O que acontece
quando os crentes avançam sobre o espaço político é a projetação
no político de um plano de crenças que são do foro íntimo de seus
seguidores, existindo aqui um desejo de apropriação do político
como um instrumento de poder para afirmação de suas crenças
pessoais.
Me pergunto aqui se Deus precisa de uma
ajudinha, ou o milênio foi adiantado?
Os cristãos evangélicos estão
experimentando o poder e estão gostando, agora, o que acontece
depois? A meu ver, isso tem tudo para dar certo. Explico.
A incompetência política do crente é
a mesma do brasileiro não crente. Existe uma imbecilidade do poder
que afeta a todos nós e acreditamos que o certo é quem está
ganhando, ponto. Assim, o crente político tornará a vida do
brasileiro algo que extravasará o limite do suportável, tipo o que
o PT e o PMDB já estão fazendo. Todos aqueles que não se
identificam com esta ideia de heterofobia, cristofobia, etc, que não
se importam com a sexualidade, nem com a religião alheia, serão
obrigados a se envolverem na política, para enfrentar esse autismo
democrático. Aleluia!
E pensar que Jesus convenceu pelo
silêncio, coisa tão eloquente que mudou a história. Este silêncio,
porém, passa longe da postura dos atuais líderes evangélicos.
Jesus tinha milhares de seguidores, influência e poderes miraculosos
e o que ele fez com tudo isso? Aceitou um beijo de Judas e foi
crucificado. Derrota não? Devia ser o presidente do sinédrio, ou
concorrente do Herodes.
Os crentes estão desperdiçando o
melhor do cristianismo e o brasileiro o melhor da política. Estou
ficando extremamente entediado com esse sagrado meia boca e esta
política que não se coloca, é uma política do terninho com boton
e carrões oficiais, onde está a vida e o sagrado meu deus!?
Concluo que o crente salvará a
política pelo avesso, e me acalmo somente com a loucura santa do Lao
Tse.
“Anule o sagrado e abandone a
inteligência
E o povo cem vezes se beneficiará
Anule a bondade e abandone a justiça
E o povo retornará ao amor filial e ao
amor paternal
Anule a engenhosidade e abandone o
interesse
E não haverá mais ladrões nem
roubos” Tao Te Ching cap. 19
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